Coisas por dizer
E como tu adoravas isso. A sensação que provocavas em mim. Eu era o teu bichinho de estimação sem amor-próprio. Pavoneavas-te para mim. Atiçavas. Afirmavas sempre que me amavas e dizias tudo o que eu queria ouvir. Para ti, eu era simplesmente aquele que gostavas de ter por perto quando te sentias sozinho. Porque o teu maior medo é ficar sozinho. Descobrires que afinal não és tão bonito quanto pensas. Que, afinal, não és tão inteligente quanto afirmas ser. Que afinal és um ser tão aborrecido, tão superficial - como anedotas: giro no início mas que depressa perdem piada. E como isso foi bom para ti. Ter-me ali, açaimado pelas coisas que ficaram por dizer e de trela pelo meu amor-próprio, para a tua diversão. E como deves ter gozado com a minha cara. Todo este tempo.
Mas sabes que mais? A trela que seguras agora não é o meu amor-próprio e o açaime que uso agora não são as palavras que nunca ouviste. Porque eu fartei-me. Já não sou esse boneco que achavas que eu era. Já não sou o teu bichinho de estimação, porque nunca levaste o meu amor-próprio. Encontrei-o perdido junto ao coração que te dei em tempos e descartaste. Pois, guardei-o. Era o meu coração! E, agora que tenho tudo o te dei de volta, posso dar-te tudo o que ficou por te dar. E estas são as coisas que tinha para te dizer: "Vou-me embora! Para nunca mais voltar! Sou muito mais que aquilo pensavas que eu era. E, sabes, és bem menos do que te julgava. Disseste que eu não te merecia. Enganaste-te. Tu é que não me merecias. Deixo-te, com a memória daquilo que nunca terás. Não sentirás falta disso agora. Mas, quando acordares e descobrires que todos com quem dormes não te conhecem e não te amam, e descobres que sempre estiveste sozinho, que sempre viveste o teu medo. Aí sim, sentirás que, comigo tudo foi diferente. E terás tudo menos aquilo que procuravas com tanto afinco. Vencer o teu medo. E eu estarei aqui, mas inexoravelmente longe de ti. Aliás, como sempre."